segunda-feira, 26 de maio de 2014

PRATA, AGORA O OUTRO

Quem me arrasta para ótimas viagens é o Antônio Prata, um cronista saboroso, entendam isso com quiserem. 

A crônica dá sabor à vida, como se ela o tivesse, e tem. 

domingo, 11 de maio de 2014

VIAGEM


_ Se estivéssemos só nós dois, passeando numa praia deserta de uma ilha do Caribe, você transaria comigo no mar?
_ Que que é?
_ Se estivéssemos andando de mãos dadas por uma praia deserta, depois de termos bebido duas garrafas de champanhe, eu com um vestido branco colado ao corpo e você sem camisa e sem sapatos, ambos iluminados pelo sol nascendo no mar...
_ Dá pra você ser mais objetiva?

_ Por que você nunca mais beijou o meu pescoço?

sábado, 10 de maio de 2014

BARATAS

Num resort de panelas e pratos sujos, duas baratas fazem amor e nem notam minha presença onipotente.
Devo aniquilar um casal de amantes, envenenando-os sobre a pia da cozinha?
Descontarei neles a raiva pelo meu próprio desleixo? 
Ensandecido, dou- lhes um jato de inseticida. Outro. E mais outro. 
No dia seguinte, os insetos ainda se arrastam, até receberem a vassourada de misericórdia.
APARÊNCIAS


O mundo das aparências é muito interessante. Um paletó na cadeira de trabalho pode significar que a pessoa já chegou. Mas se o paletó ficar por mais de um dia lá, pode significar que a pessoa faz tempo que não chega.
Se você quer ler jornal no trabalho e teme que isso seja visto como falta de assunto ou perda de tempo, a sacada é ler de pé, com o jornal apoiado sobre a mesa, como se você, ao passar por ali, tivesse visto uma notícias dessas fundamentais para a sobrevivência da empresa. Faça um ar de gerúndio.

E se quiser dormir um pouco depois daquela feijoada, prepare a desculpa antes fechar os olhos com o rosto colado na mesa de trabalho. Assim, quando você acordar e o chefe estiver passando por ali, a rapidez da sua justificativa pode até colar. Diga que os índios também identificavam tremor de terra com os ouvidos no chão.  Sei lá. Mas seja criativo e não titubeie. Se você conseguir que o chefe também encoste a cabeça dele na mesa, tome muito cuidado para que não seja em cima da sua baba.

ESPELUNCA






 Parei num daqueles restaurantes de beira de estrada, que a gente pode chamar de espelunca. Olhei para balcão de vidro e pedi uma coxinha. O balconista pegou a coxinha, deus uns tapinhas nela, tirando um pó amarelado e disse: “Isso não é coxinha não, moço. É ovo.”
No balcão também tinham umas salsichas em conserva, que pareciam se mexer dentro do vidro. Pedi então uma porção de macarrão e uma pinga, pra matar qualquer germe que tivesse ali. Junto com o macarrão veio um prato com umas manchas esquisitas.
“Quequé isso aqui no prato, moço?”.
“É desenho”, ele respondeu.
“Então deve ser desenho animado, porque está mexendo”, concluí.
Tomei só a pinga - pra esquecer - e pedi a conta. O balconista então fez a soma das despesas, rabiscando com o dedo a gordura que havia no fundo de um prato.

Antes de sair, tomei o cuidado de lavar muito bem as mãos com um pouco daquela pinga.
FILA

Brasileiro gosta de uma fila. Ele acha que tudo que é muito fácil não tem valor. Então tem que pegar fila.
A gente pega fila até sem saber por quê. O negócio é garantir um lugar. Vai que é bom.
A fila é um grupo virtual que tem por objetivo se desfazer o quanto antes. Por mais legais que sejam as pessoas na fila.
Mas gente que não é tão legal. O fura-fila é aquele cara que pára pra conversar com a pessoa da sua frente e acaba passando você e o resto da fila na conversa. Pode ser que ele seja o último a ser atendido e você será, literalmente, passado pra trás.
A fila que a gente entra normalmente é aquela que não anda. E se a gente mudar de lugar, a outra é que não vai andar.
Quanto maior é a fila, mais o seu lugar está valendo. Tem gente que ganha a vida guardando lugar em filas. Leva cadeirinha, colchonete e até fogãozinho. Depois vende o lugar e compra outra cadeirinha, pro filho também entrar na profissão.
Duro é pegar a fila errada. Quando chega a nossa vez a gente descobre que perdeu três horas à toa. Quer dizer: não totalmente à toa. A gente aprendeu a conjugar o verbo filar.
Filou um cigarro. Filou uma bolacha. Filou o caderno de esportes do jornal do vizinho. Filou um carteado. Mas não importa: foram três horas numa fila sem precisar.
E tem aquela fila que não anda, porque sempre entra uma gestante na sua frente. Sem barriga nem nada. Fila da mãe!


Olho pra vida e não vejo uma saída.

Que falta fazem as aeromoças.
Quando a internet surgiu, uma imagem levava um tempão pra ser baixada. E vinha linha por linha, como uma máquina de tecer. Na tela do computador, a mulher ia ficando nua aos pouquinhos. Tinha o sabor de um streep tease.

RAIMUNDO BATISTA

RAIMUNDO BATISTA

A vida de Batista é bater. Bate a mão no despertador às cinco da manhã. Bate uma gemada. Bate a porta de casa. Alguém bate a sua carteira no ônibus.
Sua carteira tem uns poucos trocados, fotocópia do RG, uma fração da loteria federal e duas fotos: uma batida com a mulher, em Aparecida, e outra no estádio de futebol, com os filhos.
Bate cartão às oito. Aí bate carimbo até as cinco da tarde. Papéis e mais papéis passam pelas suas mãos para serem carimbados.
Bate o sino do almoço. Toma uma batida de limão e come umas batatas fritas no boteco. Às vezes come uma salsicha em conserva e passa o aresto da tarde com azia.
Bate os olhos numa morena nova na repartição.
Bate o cansaço. Bate o cartão. Bate em retirada.
Bate mais uma pinga. Bate a lembrança da colega de trabalho. Bate a fome. Volta à pé, sob a garoa fina.
Bate na porta. Bate na mulher.
_Você está bêbado, Batista!
_De amor, mulher. E não é por você!
Batista cai sobre a mesa, derrubando o vaso de louça, com flores de plástico. 

Amanhã, sua mulher beija-lhe a testa fria: Batista bateu as botas. 

SMOKE


MÃE

mãe não rima com nada
porque não tem nada igual
mãe é mãe
e ponto final

sábado, 3 de maio de 2014

IMPORTÂNCIA


O que é que o guerreiro e o palhaço têm em comum? Na próxima quarta-feira, nós iremos explorar esse assunto tão instigante e divertido, e eu resolvi escrever uma crônica sobre esse assunto. 
Algo me diz que ele é um assunto muito legal. Mas por enquanto eu só tenho três linhas escritas, o que significa que eu não posso contar com o ovo na barriga da galinha, se é que o ditado é esse mesmo.
Eu serei o palhaço, que estarei ao lado do mestre em aikidô, José Bueno, do Instituto Harmonia, para um divertido encontro. O evento é aberto ao público, que pode se inscrever aqui: https://docs.google.com/forms/d/1DVClNLxZEi-aX1nuvkWkbvKPt_61Bp7ZaxbXCdZBiew/viewform

MAS DEIXE ISSO PRA DEPOIS

AGORA FIQUE COMIGO NESSA EXPLORAÇÃO.

O QUE É QUE O GUERREIRO E O PALHAÇO TÊM EM COMUM?

AMBOS SÃO VULNERÁVEIS. AMBOS LIDAM O TEMPO TODO COM O IMPREVISÍVEL. TUDO É IMPREVISÍVEL. E O QUE É PREVISÍVEL É UM TÉDIO. 

E se você chegou agora e não está entendendo nada, fique tranquilo, nem eu. 

sexta-feira, 2 de maio de 2014

O que você faria se tivesse uma TV movida a traço?  Não sentiria uma extraordinária liberdade? Olha o lado bom:  você e eu estamos aqui. Um encontro casual. Uma colisão. Sem vítimas. Por enquanto.

Aqui eu não  escrevo nada de bom, não preciso agradar  nenhuma opinião pública. Esse é o lado bom do anonimato. Ótimo.

Você e eu somos os únicos visitantes desse blog. Eu venho aqui pra ter a coragem de dizer asneiras em público. E você vem porque. Bem, você deve saber.

Eu sou um escritor. Escrevo para as paredes. E nas paredes.